DECLARAÇÃO À NAÇÃO

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Mais do mesmo assunto no primeiro post deste blog

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O QUE ESTÁ EM JOGO NA BRIGA TIGRE VS. SÃO PAULO CONTRA CONMEBOL

Hoje, muitos estão pelas ruas comemorando o título mundial do Corinthians, aliás merecido. Enquanto isso, vários outros personagens do futebol sul-americano se engalfinham em uma batalha inglória. Tudo começou na final da Copa Sul-Americana entre o São Paulo e o Tigre, pequeno time de bairro da cidade de Victoria, província de Tigre, nos arredores de Buenos Aires, que pela primeira vez em sua história de mais de 100 anos chegava a uma final internacional (N.E.: isso lembra um time paulista que conheço... mas deixa pra lá).

No campo, mesmo com o placar marcando "somente" 2x0 após o fim do 1° tempo da segunda partida, era nítida a superioridade do São Paulo sobre o combativo e muitas vezes violento time argentino, que parecia jogar como os "hermanos" faziam até a década de 90, indo além da "catimba", que seria uma malandragem disfarçada, para se comportarem de forma explicitamente intimidatória.


Contudo, incidentes no intervalo desta segunda partida fizeram com que o time argentino decidisse não retornar para o segundo tempo. O que aconteceu? O time argentino diz que foi agredido por policiais e seguranças armados no vestiário e que isso abalou a todos de tal modo seguir jogando seria impossível. O São Paulo diz que seus seguranças apenas contiveram jogadores que queriam entrar em um corredor que acabava no vestiário do time brasileiro. Mesmo que nenhum dos lados tenha feito muito para serem considerados dignos de total idoneidade, visto que já haviam trocado farpas em outras ocasiões durante a decisão, este é um episódio que ainda terá vários desdobramentos.

Um destes desdobramentos tem a ver com as sanções que podem ser aplicadas, desde interdição do estádio para competições sul-americanas até suspensão do clube por um determinado período. Tudo porquê ainda será apurada a responsabilidade pelo incidente. O problema é que o histórico de punições da CONMEBOL não é animador. Mesmo já tendo finais interrompidas após incidentes (Santos 2 x Peñarol 3, pela Libertadores de 1962), a única ação efetiva da entidade foi uma punição ao Corinthians graças a uma briga generalizada de sua torcida contra a polícia após a eliminação do clube da Libertadores de 2006.

Sobre as responsabilidades no ocorrido, cada um pode tomar partido de quem quiser. Mas a questão é pensar no que se perderia ao se punir um ou outro lado, pois esta não é uma atitude em que apenas a justiça está em jogo, mas a política da entidade CONMEBOL também está em xeque aqui. A esta altura, não há evidências fortes de que o São Paulo tenha "provocado" a confusão, portanto será difícil que ela puna o São Paulo com a perda do título, visto que a diferença técnica era muito grande, ou expulsão da próxima Libertadores, mas ainda é possível que o clube perca o mando de campo para as competições da entidade.


O corda para o Tigre está mais apertada. O histórico recente mostra que eles estavam muito mais propensos a um enfrentamento do que o time do São Paulo, o que faz sua tese de que o clube preparou uma "emboscada" para eles no vestiário ficar muito frágil. Mesmo as imagens feitas por um dos jogadores não revelam nada. O problema para o Tigre é que se vier à tona que a confusão toda foi provocada por eles, isso legitimaria a punição que a entidade já prevê para o caso de WO, que foi o que ocorreu no segundo tempo: 3 anos fora de competições internacionais, para um clube que também está classificado à próxima Libertadores.

Mas por quê o Tigre tem vaga, se ficou em posição intermediária na contagem agregada de pontos do Campeonato Argentino? Aí entra um outro elemento na estória: Julio Grondona, presidente "ad eternum" da Federação de Futebol da Argentina. Ele é um hábil articulador político, visto que está no poder desde 1979. Ele, como grande aliado da atual presidente argentina Cristina Kirchner, apoiou todas as suas iniciativas para "democratizar" o futebol argentino, através do projeto "Fútbol para Todos". Com isso, redistribuiu as cotas de televisão entre os clubes e bateu o martelo para que o próprio governo se apropriasse das transmissões através de seu canal público.

Outra marca desta cooperação mútua foi a iniciativa de recriar a Copa Argentina, que assim como a Copa do Brasil passou a classificar também à Copa Libertadores (mas só a partir do ano que vem; este ano o Boca Juniors foi campeão e pôde "apenas" jogar a Sul-Americana). Uma das marcas deste torneio é de que todos os jogos aconteceram pelo interior da Argentina, não nas sedes usuais dos clubes, como queria Cristina Kirchner. Mas o fato de Julio Grondona ter "encaixado" seu campeão nas competições sul-americanas mostra também sua grande influência junto à CONMEBOL.

Outra grande tacada de Grondona foi conseguir uma vaga exclusiva para a Argentina na Libertadores a partir da Sul-Americana. Ou seja, não é apenas o campeão da Sul-Americana que vai à Libertadores do ano seguinte, mas também o melhor time argentino na competição. E é aí que entra o Tigre, pois ele está classificado à Libertadores 2013 exclusivamente por causa deste arremedo construído pela presidente de sua federação, interessado de que mais clubes pequenos "ascendam" rumo a posições melhores no cenário sul-americano.



E então, como fica a CONMEBOL em relação a uma possível decisão de punir o Tigre? Será que eles confrontariam Julio Grondona, que parece mais sólido no poder que um "padrino" e que já declarou apoio ao Tigre, mesmo com todas as evidências em contrário a respeito do que sustentam como verdade? A AFA blefa dizendo que não quer se envolver nas decisões da CONMEBOL, exatamente para "não alimentar atritos". Mas como serão os acordos que estão sendo costurados "por baixo do pano", comportamento este tão característico das nossas democracias sul-americanas? Por isso e mais um pouco, não podemos dizer que se fará justiça neste caso, pois afinal este não é o único contexto em que Justiça e Política se confundem, pois mesmo que todo ato de justiça seja político, pois afinal se toma partido por um ou outro lado, às vezes o bom senso acaba não prevalecendo.

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